RICARDO COTA
Injustiça lembrá-lo pela violada no III Festival de Música Popular Brasileira, realizado em 1967, no Teatro Paramount, em São Paulo, no ano de 1967. Sérgio Ricardo foi muito mais do que uma atitude, embora fosse esta uma de suas maiores características. Sua trajetória esteve vinculada a pelo menos dois movimentos cruciais da cultura nacional: a bossa nova e o cinema novo.
Talento multidisciplinar, foi compositor, cantor, escritor, ator e cineasta. Imortalizou sua potente e inconfundível voz numa de suas parcerias com Glauber Rocha, no filme “Deus e o Diabo na Terra do Sol“. A corrida de Corisco ao término do longa, embalada pelo canto do artista, fixou-se para sempre na memória do cinema brasileiro. Como o protagonista do panegírico glauberiano do sertão, Sérgio Ricardo só se entregou na morte, e com certeza de parabelo na mão.
No dia de sua passagem, aos 88 anos, a Cinemateca do MAM homenageia Sérgio Ricardo enaltecendo o seu legado como cineasta. Escolhemos “Esse Mundo é Meu“, lançado em 1963, um ano antes da estreia de “Deus e o Diabo na Terra do Sol”. Neste filme, que faz parte do acervo da Cinemateca Brasileira, o cineasta deixa claro o compromisso com o cinema de empenho social e político ao acompanhar a trajetória de um operário engajado, inconformado com o baixo salário e a precária situação financeira sua e de seus pares. Um filme expressivo, pujante, musical, com imagens premonitórias da cidade partida, e pelo menos duas sequências antológicas: o passeio do operário e sua namorada no centro da cidade e o girar do casal na roda-gigante, magistralmente fotografados com a singular câmera na mão de Dib Lutfi, irmão de Sérgio.
Como curiosidades, “Esse Mundo é Meu“ tem o samba “Pregão“, com letra de Cacá Diegues, Ziraldo no elenco e montagem assinada por Ruy Guerra e Sérgio Sanz, cujo pai, o escritor José Sanz, foi curador da Cinemateca do MAM.
RICARDO COTA é curador da Cinemateca do MAM