O Acervo Djalma Correa: primeiras ações de preservação de um arquivo multimídia

Rio de Janeiro, 30/09/2020
Por: Cecília de Mendonça

O projeto Acervo Djalma Correa: Música e Cultura Afro-brasileira é desenvolvido pela Balafon – Núcleo Brasileiro de Percussão, com o apoio do programa Rumos Itaú Cultural, tendo como objetivo central a preservação do acervo analógico e multimídia do músico e pesquisador Djalma Correa.

O mineiro Djalma Correa, reconhecido por sua atuação como percussionista, desenvolveu um significativo, e ainda pouco conhecido, trabalho de registro e pesquisa, em que reuniu, desde meados da década de 1960, em um extenso acervo, vasta documentação sobre a música e a cultura popular brasileira. O trabalho mais intensivo de gravações foi nos anos 1970, período em que viveu na Bahia e aprofundou sua pesquisa sobre a percussão afro-brasileira, chegando a viajar por diversas regiões do Brasil fazendo gravações de campo. Nesse mesmo período, Djalma Correa teve grande presença na indústria fonográfica brasileira e na cena musical da chamada MPB. Nessa área, Djalma, além de tocar, fez também muitos registros de shows e de ensaios de importantes artistas brasileiros como Gilberto Gil, Caetano Veloso, Luiz Gonzaga, Maria Bethânia, Alcione, entre tantos outros.

O Acervo de Djalma Correa é composto de aproximadamente 670 fitas rolo, 10.000 documentos fotográficos, incluindo cromos e negativos, cerca de 100 rolos de super 8 e três filmes em 16mm. Possui também diversos itens não contabilizados como livros, vinis, fitas de diversos formatos, milhares documentos em papel (projetos, cartas, recortes de jornal e etc.) e, ainda, muitos instrumentos musicais. Todo o acervo está reunido na residência do músico na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro.

Iniciamos, oficialmente, o trabalho no acervo em abril de 2019. A proposta original do projeto era a organização e digitalização de parte do acervo do músico, voltado para as culturas populares e as religiões afro-brasileiras e de matriz africana. Mas, logo no início dos trabalhos, percebemos que uma ação inicial de conservação preventiva de todo o acervo era fundamental. Em nossas primeiras ações, buscamos estruturar a sala de trabalho para as atividades de digitalização e também para o melhor acondicionamento dos materiais como um todo (exceto os instrumentos musicais que ficam em outro espaço). Entendemos que era preciso conhecer e organizar a totalidade dos documentos preservados por Djalma Correa, num processo de organização mais amplo, até para entender e definir como seria a seleção dos documentos do projeto.

Na perspectiva de um olhar para o arquivo pessoal do artista, seus livros, vinis e papéis diversos, são tão importantes como as fitas rolo, os cromos e os super-8, formatos foco do presente projeto. Deparamo-nos também como uma série de formatos analógicos e digitais que dão conta de evolução tecnológica das formas de registros sonoros e visuais. São fitas de diversos formatos como cassetes, DAT, Mini DVs, Umatics, VHS, Hi-8 e MDs.

A digitalização das fitas rolo, dos cromos e dos super 8 estão sendo feitas no próprio local, com a imprescindível consultoria de Marcos Issa, para os a parte fotográfica e de Marco Dreer, para os áudios e os filmes. O trabalho de digitalização acabou demorando mais do que o planejado para ser estruturado, mas está possibilitando uma digitalização muito mais ampla do que se tivéssemos terceirizado as ações.

Apenas no final de 2019 começamos os primeiros testes de digitalização e o trabalho de higienização e em janeiro de 2020 iniciamos de fato as primeiras digitalizações, trabalho que foi parcialmente interrompido em março de 2020, sendo aos poucos retomado por José Caetano Dable Corrêa, filho de Djalma. Com a pausa e a desaceleração impostas pela pandemia, ganhamos tempo para pensar as melhores maneiras de catalogar os documentos. O trabalho tem como proposta final a construção de um catálogo dessa parte do acervo que estamos chamando de Coleção das Culturas Populares. De setembro para cá, durante as atividades do projeto, gravamos algumas conversas com Djalma. A presença do colecionador é muito importante e suas memórias trazem uma particular riqueza ao processo de qualificação do acervo.

O trabalho com o acervo como um todo está se configurando de forma que ele seja organizado em coleções temáticas. A primeira delas é a Coleção das Culturas Populares. Porém, nesse trabalho de preservação estamos identificando uma série de outros assuntos tão interessantes e importantes como esse selecionado inicialmente. São elas: Coleção MPB (maior volume de fitas rolo do acervo), Coleção Baiafro (registros únicos e inéditos do grupo criado por Djalma, na década de 1970, em Salvador), Coleção Trilhas Sonoras e Música Eletrônica (parte de sua produção autoral), Coleção Maria do Carmo Corrêa (acervo de música erudita, grande parte constituído por sua irmã), Coleção África e Músicas do Mundo (registros feitos em viagens, gravações comerciais de pesquisa e registros de grupos de outros países que se apresentaram aqui no Brasil). Além desses seis conjuntos, ainda existem muitos documentos não identificados que podem constituir outras coleções.

Está em nossas metas buscar formas de viabilizar a continuidade das ações iniciadas agora, já que pelo volume e pela diversidade de formatos ainda é difícil vislumbrar uma digitalização integral do acervo. O projeto em curso, viabilizado com o apoio do programa Rumos Itaú Cultural foi um importante passo para a preservação desse material tão significativo para a cultura e a música brasileira e permitiu-nos um estruturação básica. A partir dessa primeira organização, um de nossos objetivos é fazer uma devolutiva aos grupos e artistas registrados. Planejamos, também, iniciar uma série de ações de consulta a artista e herdeiros, sobre os direitos autorais e de propriedade intelectual e possibilitar assim a difusão do acervo para pesquisadores e para um público mais amplo.

Cecília de Mendonça é coordenadora geral do projeto e doutoranda em Antropologia no PPGSA- UFRJ, onde realiza pesquisa sobre a trajetória e o acervo de Djalma Correa. Para maiores informações entre em contato pelo e-mail [email protected]



Acessibilidade | Fale conosco | Imprensa | Mapa do Site